28 de mai. de 2011

PETIÇÃO INICIAL - Conceito – Função – Conteúdo – Estrutura – Forma

O direito de agir, isto é, de invocar a tutela jurisdicional do Estado, exercita-se por meio de petição escrita, concretiza-se por mediante formulação, ao juiz, de uma providência processual adequada. A essa petição dá-se a denominação de petição inicial. Na prática, pela lei do menor esforço, denomina-se apenas inicial.

Esse escrito, inicial, é necessário em nosso sistema jurídico. O Código de 1.939 dispunha no art. 158: "A ação terá início por petição escrita, na qual, delimitamos os termos de seu objeto, serão indicados...". O Código de 1.973, em moderna terminologia, dispõe que "nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado requerer, nos casos e formas legais" (art. 2º); prescreve no art. 282 os requisitos da petição inicial.

Sem petição inicial, sem o primeiro impulso da parte ou do interessado, nenhum juiz dá começo a processo – Ne procedat judex ex officio.

A petição e a sentença são os extremos, inicial e final, do processo. São, no dizer de Bonumá, os dois atos assenciais do processo. Aquela, o mais significativo dos atos da parte; esta, o mais importante ato do juiz. Entre esses dois atos culminantes se desenvolve toda a atividade processual, "podendo-se dizer que os atos intermediários se praticam em razão da inicial e com a finalidade da sentença".

O juiz não pode atuar sem provocação, e fixar objeto da controvérsia. E como os atos intermediários se praticam em razão da inicial, do libelo, e com a finalidade da sentença, esta não pode desdobrar os limites daquele – Sententia debet esse conformis libello. "O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte" (CPC, art. 128).

A petição inicial indicará: I. o juiz ou tribunal, a que é dirigida; II. Os nomes, prenomes, estado civil, profissão, domicílio, residência do autor e do réu; III. O fato e os fundamentos jurídicos do pedido; IV. o pedido, com suas especificações; V. o valor da causa; VI. As provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; VII. O requerimento para a citação do réu (CPC, art. 282). E "será instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação" (art. 283).

Esses requisitos têm por fim; a) identificar as partes; b) possibilitar a localização pelo oficial de justiça, do autor e do réu; c) verificar a legitimação ad processum e ad causum; d) permitir a decisão sobre a lei a aplicar ( a nacional ou a estrangeira); e) determinar o tipo de procedimento (ordinário, sumário), a interponibilidade de recurso; f) estimar os honorários de advogado – pelo valor da causa, etc.


São requisitos essenciais; sem algum deles a petição será irregular, defeituosa e, posto que emendável pelo autor, pode vir a ser indeferida por inepta (art. 284 e 295).

Todos os preceitos do art. 282 (requisitos essenciais da peça inaugural do processo em juízo) e do art. 283 (instrução dela com os documentos "indispensáveis" à propositura são de uma relevância para a parte chamada em juízo, para o juiz invocado a atuar na formação de relação processual, a presidir o processo, a dar, finalmente a satisfação de interesse que o autor pedir ou exigir, a prestar a tutela jurisdicional que o Estado, através da Constituição promete, assegura a todos os cidadãos, aplicando a lei, restabelecendo ou declarando a existência ou a inexistência de relação jurídica, declarando a autenticidade ou a falsidade de documento – em processo de conhecimento, em processo cautelar – em procedimento comum ou especial, ordinário ou sumário.

Costuma-se dizer, censurando o despreparo do profissional egresso da Faculdade de Direito, que o "coitado não sabe, sequer, fazer uma petição". Como se fazer uma petição fosse ato banal!

Fazer, propriamente, talvez. Mas elaborar uma petição inicial requer ciência e arte. Pressupõe tomada de conhecimento dos fatos, conhecimento do direito (material e processual), identificar o tipo de ação adequada, se aplicável direito nacional ou estrangeiro, direito comum ou especial, sem falar no juízo e no juiz competente a que ou a quem deve ser dirigida; uma série, enfim, de problemas a ser de logo resolvida antes que seja tarde.

Só o conhecimento teórico e prático, o bom-senso, a paciência, a pesagem dos pró e dos contra assegura, muitas vezes, uma peça capaz de vencer a improbidade dos ladinos, dos que na sombra se armam, para de um simples golpe, colocar por terra o trabalho de um profissional que muito confiou na lisura do adversário ou se descuidou dos perigos da maldade humana, dos percalços da ignorância.

Em direito presume-se a boa-fé, exige-se lealdade, arma-se o juiz de poderes para impedir que a prática de ato simulado ou a busca de fim ilícito macule o processo e dificulte a reta aplicação do suun cuique tribuendi. Isto, porém, não basta para frenar os ímpetos do improbus litigator.


A estrutura da petição inicial, sua forma, sua linguagem, seu estilo, são de muita importância.

No regime das Ordenações, e ate depois delas, havia dois tempos na propositura da ação: a) a chamada do réu à audiência, por meio da ação; e b) a acusação da citação em audiência por meio do libelo, peça articulada.

Ramalho definiu libelo "ato pelo qual o autor propõe por escrito e articuladamente a espécie da questão, que se há de tratar em juízo, e conclui pedindo a condenação do réu" (Praxe, § 125).

Paula Paptista, mais preciso: "Libelo é o ato pelo qual o autor propõe por escrito e articuladamente a questão, que se há de tratar em juízo, e conclui pedindo a condenação do réu" (Teoria e Prática, § 102).

Em nota dizia que era costume exarar no libelo certas cláusulas, com as seguintes letras iniciais: E.S.N., que querem dizer: e sendo necessário; P.N., protestos necessários; P.R C.J., pelo recebimento e cumprimento de justiça; E.C., e custas, "cláusulas estas inteiramente inúteis". Adiantava, entretanto, que a forma articulada tende a boa ordem na exposição dos fatos, na produção da prova, mormente a testemunhal, o que mui facilita o exame e apreciação das questões á decidir.

O regulamento nº 737, de 1.850, simplificando o processo, admitiu fosse a ação ordinária iniciada "por uma simples petição", de conteúdo complexo, formal, articulada ou não (art. 66). João Monteiro, contudo, achava de melhor estilo redigir por artigos o libelo, "porque de tal sorte se torna mais fácil sujeitar à prova os fatos originários da ação" (Teoria do Processo Civil e Comercial, § 97, nota 1).

É conveniente lembrar ou esclarecer que a partir da instituição do Código de Processo nacional, de 1.939, a petição inicial passou a ser, por si só, o instrumento de propositura da ação, sem os dois tempos, sem a "acusação da citação em audiência". Fundiram-se a petição e o libelo. Atualmente petição inicial e libelo, são sinônimos.

Preconizamos a forma articulada, com emprego de algarismos e letras para indicar as partes em que se divide a peça. A divisão facilita a identificação da matéria de fato e de direito, economiza repetições inúteis e cansativas, torna mais atraente a leitura, elimina a inutilidade e a monotonia dos Provarás

A narração dos fatos, ensina Borges da Rosa, deve ser metódica, e clara, completa, precisa, proba, concisa, congruente, comedida (Processo Civil, vol. I, p. 641).

A linguagem deve ser cuidada. O estilo, desativado e sóbrio, a fim de que a leitura se torne amena. Causam má impressão as petições longas, escritas sem vida, sem arte, sem calor.

Também as sentenças merecem esses cuidados. Ganham em economia e clareza, se metódicas e bem divididas, marcadas suas partes com algarismos ou letras. Lê-se em acórdão do Supremo Tribunal Federal: "...sentença sóbria e concisa é aquela que, em linha de princípio, quadra ao estilo severo dos julgamentos" (Direito, 49/184).

Por Wesley Campos

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