EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ
DE DIREITO DA ______ª VARA DE FAMÍLIA DO RIO DE JANEIRO(RJ).
(CPC, art. 100, inc. I)
[ Formula-se
pedido de tutela antecipada ]
FULANA DE TAL, brasileira,
casada, médica, residente e domiciliada na Rua Xista, nº. 0000, na cidade do
Rio de Janeiro(RJ), inscrita no CPF(MF) sob o nº. 111.222.333-44, portadora do
RG nº. 99887766 – SSP/RJ, vem, com o devido respeito à presença Vossa
Excelência, por intermédio de seu patrono que abaixo assina – instrumento procuratório acostado --,
causídico inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Rio de Janeiro,
sob o n º 445566, com endereço profissional consignado no timbre desta peça
processual, onde, em atendimento à diretriz do art. 39, inc. I, do Código de
Ritos, indica-o para as intimações necessárias, para, com supedâneo no art. 1.521, inc. VI c/c art. 1.548, inc. II e art. 7º,
§ 1º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Lei nº. 4.657/42),
ajuizar a presente
AÇÃO ANULATÓRIA DE CASAMENTO
contra BELTRANO DE TAL ASSAAD, brasileiro naturalizado, casado,
empresário, atualmente em local incerto e não sabido, pelas seguintes razões de
fato e de direito:
1 – QUADRO FÁTICO
Os
cônjuges, ora litigantes, encontram-se casados desde o dia 00 de junho de 0000,
sob o regime de comunhão parcial de bens, casamento este celebrado no Brasil,
conforme se comprova pela certidão de casamento ora anexa.(doc. 01)
Do
curto enlace matrimonial não resultaram filhos, muito menos
chegaram a construir patrimônio em comum.
Após
alguns meses do início do relacionamento conjugal, Autora e Réu passaram a ter
desavenças sérias, as quais tornaram o relacionamento extremamente conturbado.
Tais dissabores foram, a princípio, por situações de consumo contumaz de álcool
por parte do Réu, chegando às barras do alcoolismo. Ademais, existiam fortes
indícios, pelas atitudes tomadas pelo Promovido, que o mesmo fosse usuário de
drogas ilícitas, tudo isso com a profunda transformação de personalidade do Réu
após o casamento.
Certa feita,
já nos idos de 0000, após constantes brigas entre ambos, o Réu expulsou a
Autora do apartamento em que conviviam na cidade de Pouso Alegre(MG). Logo em
seguida, após um mês, o próprio Promovido abandonou o referido apartamento,
deixando-o em estado precário e com dívidas para a Autora, visto que o mesmo
era alugado em nome desta. A propósito, por conta disto, a Promovente tem
contra si algumas ações judiciais de cobrança de dívidas da relação locatícia
ora evidenciada.
A partir deste
momento, ou seja, desde 0000 a Autora não tem conhecimento do paradeiro do Réu.
Já com laços
sérios de afinidade com novo parceiro e, por conta disto, almejando celebrar um
novo casamento com este para o mês de março próximo, a Autora tentou desesperadamente
procurar o Réu na Cidade de Pouso Alegre(MG), mais precisamente na primeira
semana do ano em curso. O Promovido, de origem do Líbano, fora procurado
sobretudo na colônia libanesa naquele Estado. Contudo, não obtivera êxito no
seu propósito, qual seja, encontrar o Réu e realizar um divórcio extrajudicial.
Após algumas
indagações aos compatrícios do Réu, a Autora fora informada que o Promovido
havia retornado ao seu País de origem(Líbano), para tornar a residir com sua
esposa, com quem era casado há aproximadamente quinze(15) anos.
A notícia foi
estarrecedora. À luz destes fatos, a Autora então tomou conhecimento que o Réu casara com a mesma em estado jurídico
de bigamia, visto que, à época do enlace matrimonial com a mesma no
Brasil, o Réu já era casado com outra
esposa no Líbano.
De pronto a
Autora tomou providência junto ao Consulado do Líbano no Brasil, onde fizera
requerimento para obter a certidão de casamento do Réu.(doc. 02)
Para seu
espanto, de fato o Réu era casado no Líbano desde 0000, com que se comprova
pela Certidão ora acostada, a qual devidamente traduzida pelo tradutor oficial
do idioma árabe Abrahim Mohamed.(doc.
03)
Há, portanto,
prova inconteste de fatos que conduzem à
nulidade do casamento, à luz da Legislação Substantiva Civil .
2 – NO MÉRITO
NULIDADE DO CASAMENTO - BIGAMIA
Sem
sombra de dúvidas o quadro fático delineado nesta exordial, evidencia afronta à
Legislação Substantiva Civil, fulminando
de nulidade o casamento celebrado entre os litigantes.
Observa-se
que o Réu, quando casara com a Autora, já era casado com uma outra mulher desde
os idos de 0000, a qual reside na República do Líbano. Os litigantes, como se
observa pelos documentos insertos nesta querela, casaram-se no Brasil em 0000.
Desta
forma, a Autora, levado a erro sobre
o estado civil do Promovido, veio a celebrar casamento nulo.
É
bem verdade que o casamento realizado anteriormente pelo Réu, em um outro País,
em nada afasta a nulidade do segundo matrimônio, visto que não rompido
legalmente o vínculo matrimonial anterior.
Lei
de Introdução ao Código Civil
Art. 7º - A lei do país em que for
domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da
personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família.
§ 1º - Realizando-se o casamento no
Brasil, será aplicada a lei brasileira quanto aos impedimentos
dirimentes e às formalidades da celebração.
( os destaques são nossos )
Destarte,
à luz da legislação supra mencionada, compete
à Justiça Brasileira julgar os vícios inerentes à nulidade do casamento,
como ora ocorre, maiormente quando este fora perpetrado por autoridade
brasileira e este ato jurídico deverá, por consequência, aqui ser anulado.
Neste
mesmo importe de entendimento, vejamos as lições de Maria Helena Diniz, quando, em compêndio próprio sobre a Lei de
Introdução ao Código Civil, professa que:
“ O
casamento celebrar-se-á de conformidade com as solenidades impostas pela lex loci celebrationis ( Código
Bustamante, art. 41 ), mesmo quando for diferente a forma ordenada pela lei
pessoal dos nubentes. Há quem aceite que, quanto às formalidades intrínsecas,
seja admissível a aplicação da lei pessoal dos interessados, mas, no que disser
respeito às formalidades extrínsecas do ato, dever-se-á atender ao comando da lex loci actus. Em todos países há
permissão para que estrangeiros se casem perante suas autoridades competentes,
quer pertençam os nubentes à mesma nacionalidade, quer a nacionalidades
diferentes, e qualquer que seja o domicílio dos noivos. Realizando-se as
núpcias no Brasil, a habilitação do matrimonial e as formalidades do casamento
reger-se-ão pelos arts. 181 e 181 do nosso Código Civil, pois a lei brasileira
será aplicável mesmo que os nubentes sejam estrangeiros. Os impedimentos
dirimentes absolutos(CC, art. 183, I a VIII) ou relativos ( CC, art 183, IX a
XII), cuja infração conduz à nulidade
matrimonial, previstos na lei brasileira, deverão ser respeitados,
ainda que conflitem com a lei pessoal dos nubentes. Com isso se evitarão
penosas investigações sobre direito estrangeiro. Logo um estrangeiro casado não poderá casar-se pela segunda vez no
Brasil, mesmo que sua lei nacional admita a poligamia, que pela nossa
legislação é crime. “(DINIZ, Maria Helena. Lei de Introdução ao Código Civil
Brasileiro Interpretado. São Paulo: Saraiva, 1994. Págs. 217-218)
( não existem os destaques no texto original )
Vejamos,
ademais, quando já demonstrado que o estrangeiro deverá submeter-se à
legislação brasileira no que tange aos impedimentos do casamento, a previsão da Legislação Substantiva Civil
quanto à previsão de nulidade do casamento na hipótese ora narrada.
Código Civil
Art. 1521
- Não podem casar:
( . . . )
VI - as
pessoas casadas;
Art. 1548
- É nulo o casamento contraído:
( . . . )
II - por
infringência de impedimento.
Maria Berenice Dias, expondo linhas
acerca do tema de nulidade em face da bigamia, leciona que:
“A validade do casamento está condicionada também à
inexistência de impedimentos. Diz a lei quem não pode casar(CC 1.521). As
vedações está ligadas à interdição do incesto
e à proibição à bigamia, princípios norteadores da vida em sociedade.
Quando é contrariada a proibição legal, o casamento é nulo (CC 1548 II). A desobediência
a uma das proibições legais afeta a higidez do casamento, torna-o nulo.
“(DINIZ, Maria Berenice. Manual de
Direito das Famílias. 6ª Ed. São Paulo: RT, 2010. Pág. 276)
Nesta
mesma ordem de raciocínio são as lições de
Cristiano Chaves de Farias e Nelson
Rosenvald:
“ Também não podem casar as pessoas já
casadas, em face da vedação da bigamia, acolhida pelo ordenamento brasileiro,
perfilhando-se à maioria das legislações ocidentais.
( . . . )
Lembre-se, in
fine, a necessidade de proteger a boa-fé subjetiva (falta de conhecimento
do cônjuge que veio a casar sem saber que o seu consorte já era casado. É o
chamado casamento putativo (CC, art. 1.561), permitindo-se ao juiz emprestar
efeitos jurídicos concretos a este matrimônio que, por força da violação de
impedimento, será reputado nulo.” (FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD,
Nelson. Direito das Famílias. 2ª Ed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. Págs. 142-143)
Por
este azo, temos que o ato jurídico em
espécie é nulo de pleno de direito, restando ao Réu, inclusive,
responder por crime de bigamia. (CP, art. 235)
Vejamos,
de resto, alguns julgados atinentes ao tema em estudo:
AÇÃO
DE NULIDADE.
Inexistência de irregularidades no
procedimento de divórcio litigioso. Citação por edital. Improcedência.
Irresignação. Documento novo. Certidão de casamento. Bigamia. Nulidade do
segundo matrimônio. Ausência de efeitos jurídicos. Desprovimento. Farse-á
citação por edital: II - quando ignorado, incerto ou inacessível o lugar em que
se encontrar (art. 231, CPC). (TJPB
- AC 004.2008.001586-2/001; Rel. Juiz Conv. Miguel de Britto Lyra Filho; DJPB
17/03/2011; Pág. 8)
SENTENÇA
ESTRANGEIRA CONTESTADA. BIGAMIA. CASAMENTO CELEBRADO NO BRASIL E ANULADO PELA
JUSTIÇA JAPONESA. HOMOLOGAÇÃO NEGADA.
1. A bigamia constitui causa de
nulidade do ato matrimonial, tanto pela legislação japonesa, como pela
brasileira, mas, uma vez realizado o casamento no Brasil, não pode ele ser
desfeito por Tribunal de outro país, consoante dispõe o § 1º do art. 7º da Lei
de Introdução ao Código Civil.
2. Precedente do STF - SEC 2085. 3.
Pedido de homologação negado. (STJ
- Sec 1.303; Proc. 2006/0008671-0; EX; Corte Especial; Rel. Min. Fernando
Gonçalves; Julg. 05/12/2007; DJU 11/02/2008; Pág. 51)
REMESSA
EX-OFFÍCIO. ANULAÇÃO DE CASAMENTO. BIGAMIA. NULIDADE DO SEGUNDO CASAMENTO.
REMESSA CONHECIDA E IMPROVIDA. PEDIDO PROCEDENTE. SENTENÇA MANTIDA.
1. É nulo o casamento que viola
expressamente as regras contidas nos artigos 183, VI c/c 207, ambos do Código
Civil que dispõe que as pessoas já casadas não podem contrair outro matrimônio.
2. Remessa conhecida. Procedente o
pedido nos termos da sentença, que se mantém. (TJES - REO 048.98.024230-8; Quarta Câmara Cível; Rel. Des.
Frederico Guilherme Pimentel; Julg. 04/03/2002)
3 –
PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA
O
comando emanado do Código de Processo Civil autoriza o Juiz a conceder a antecipação de tutela “existindo prova inequívoca”:
Art. 273 - O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou
parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que,
existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II - ...
§ 1° - Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo
claro e preciso, as razões do seu convencimento.
§ 2° - Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de
irreversibilidade do provimento antecipado.
§ 3° A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e
conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4° e 5°, e
461-A.
No
presente caso, estão presentes os requisitos e pressupostos para a concessão da
tutela requerida, existindo prova inequívoca e verossimilhança das alegações,
além de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
O
fumus boni iuris caracteriza-se pelo
documento público inserto na exordial desta querela, o qual indica que o Réu,
ao tempo do segundo casamento, era casado com uma outra mulher na República do
Líbano, praticando, assim, ilegalidade no Brasil, qual seja a bigamia.
Evidenciado,
igualmente, está o periculum in mora,
eis que a Autora almeja casar-se até o final do mês de março próximo, mas,
devido ao casamento nulo em estudo, encontra-se impedida de realizar. A demora está
trazendo seqüelas profundas à Autora, não bastasse pelo descobrimento de um
segundo casamento do Réu, mas pela impossibilidade de contrair novas núpcias em
razão desta absurda situação. Trata-se, pois, de uma dupla penalidade à mesma.
DIANTE DISTO, REQUER-SE, COMO MEDIDA DE TUTELA ANTECIPADA, INAUDITA ALTERA PARS, DECLARAR A
NULIDADE DO CASAMENTO CELEBRADO ENTRE OS ORA LITIGANTES, POR INFRAÇÃO AOS
DITAMES DO ART. 1.521, INC. vi C/C ART. 1.548, INC. II, AMBOS DO CÓDIGO CIVIL,
EXPEDINDO-SE, PARA TANTO, O COMPETENTE MANDADO PARA AVERBAR-SE NO ASSENTO DE
CASAMENTO JUNTO AO CARTÓRIO DE REGISTRO CIVIL DETAL, EM POUSO ALEGRE(MG).
4 –
DOS PEDIDOS E REQUERIMENTOS
POSTO ISTO,
como últimos requerimentos desta Ação
Anulatória de Casamento, a Autora requer que Vossa Excelência se digne
de tomar as seguintes providências:
a) determinar a citação do Réu,
por meio de edital, visto que o mesmo encontra-se em lugar incerto e não
sabido(CPC, art. 231, inc. II), para, no prazo legal, querendo, oferecer defesa
aos pedidos ora formulados;
b) julgar procedentes os pedidos
formulados na presente ação para:
( i ) declarar a nulidade do
casamento celebrado entre os ora litigantes, por infração aos ditames do art.
1.521, inc. VI c/c art. 1.548, inc. II, ambos do Código Civil, expedindo-se,
para tanto, o competente mandado para averbar a alteração no assento de
casamento junto ao Cartório de registro civil de Beltal, em Pouso Alegre(MG)(CC,
art. 10, inc. I c/c LRP, art. 29, § 1º, a);
( ii ) ratificar, na sentença, o
quanto requerido e eventualmente deferido no pleito de tutela antecipada, ou
seja, a nulidade do casamento em ensejo, com baixa no cartório de registro
civil indicado;
c) instar a manifestação do
Ministério Público (CPC, art. 82, inc. II);
d) pede a condenação do Réu no
ônus de sucumbência;
e) protesta, ademais, comprovar
os fatos alegados nesta inicial por todos os meios de provas admissíveis em
direito, nomeadamente pelo eventual depoimento pessoal do Réu, oitiva das
testemunhas, perícia, juntada posterior de documentos como contraprova, tudo de
logo requerido.
Atribui-se
à presente ação o valor estimativo de R$ 100,00(cem reais).
Respeitosamente,
pede deferimento.
Rio de Janeiro (RJ), 00de outubro
de 0000.
Beltrano de Tal
Advogado – OAB(RJ) 445566