Um dos assuntos mais recorrentes para os profissionais que atuam nas áreas de Direito Público e Direito Tributário é a execução fiscal.
Da mesma forma que pessoas físicas e jurídicas entram com ações cobrando dívidas de terceiros, a Fazenda Pública possui o mesmo direito de cobrar dívidas, tributárias ou não, de devedores.
O processo judiciário que resulta dessa cobrança é chamado de execução fiscal. E é um tipo de processo muito comum no Brasil.
De acordo com a pesquisa “Justiça em Números”, de 2021, realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), dos 75 milhões de processos ativos em 2020, 36% tinham relação com execuções fiscais.
Você verá neste artigo o que é a Lei de Execução Fiscal, como o Novo CPC implica dentro desse tipo de ação, quais são as etapas da execução fiscal, o que é a Dívida Ativa, como se defender de uma execução dessa natureza e outras informações sobre o tema.
O que é a Lei de Execução Fiscal (LEF)?
Criada em 1980 a partir da Lei nº 6.830, a Lei de Execução Fiscal (LEF) define quais são os passos que a Fazenda Pública deve dar para realizar a cobrança de dívidas tributárias e não tributárias que pessoas físicas e jurídicas possam ter com o Estado.
Ela foi criada com o objetivo de estabelecer uma padronização de prazos e ações que a Fazenda Pública deve tomar para pedir, por vias judiciais, o pagamento de dívidas.
A LEF lista como entrar com a ação, como a dívida pode ser cobrada (incluindo até a tomada de bens do devedor) e qual será a ordem de prioridade entre os bens que podem ser penhorados.
As dívidas com municípios, estados, Distrito Federal e com a União são regidas pela Lei de Execução Fiscal e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil (CPC).
O que é uma ação de execução fiscal?
A ação de execução fiscal, de modo simples, é o instrumento por meio do qual o credor – no caso, a Fazenda Pública – tenta receber o que tem direito.
Portanto, a ação de execução se baseia em um título certo, líquido e exígivel. No caso da ação de execução fiscal, esse título está diretamente relacionado a uma dívida – tributário ou não – contraída junto à Fazenda.
Na prática, a ação de execução fiscal é um trâmite judicial que culmina em uma sentença em favor do credor, ou não. Se favorável ao credor, a sentença obriga o devedor a fazer o pagamento.
Se não o fizer voluntariamente em até 15 dias após o trânsito em julgado, a ação de execução fiscal permite que sejam bloqueados os bens do devedor.
Quais são as partes em uma ação de execução fiscal?
As partes, em uma ação de execução fiscal, são duas: o credor e o devedor tributário.
Localizado no polo passivo da ação, o devedor costuma ser o contribuinte. A Lei de Execução Fiscal (LEF), no entanto, lista uma série de sujeitos contra quem se pode fazer a a execução fiscal:
Art. 4º – A execução fiscal poderá ser promovida contra:
I – o devedor;II – o fiador;III – o espólio;IV – a massa;V – o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado; eVI – os sucessores a qualquer título.
Por sua vez, o Código Tributário Nacional (CTN) é mais preciso ao estabelecer claramente o papel do contribuinte, enquanto sujeito passivo:
Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:
I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.
Agora que já sabemos o que é devedor, é hora de entender quem pode estar no papel de sujeito ativo da ação, isto é, de credor.
De acordo com o Artº 1º da LEF, a cobrança, que ocorre por meio da execução fiscal, pode ser de dívida ativa junto à União, aos Estados, Distrito Federal ou Municípios e suas respectivas autarquias. Todos esses entes, portanto, podem ocupar o papel de credores.
A execução fiscal e o Novo CPC
Embora tenha importância na forma com que a execução fiscal é conduzida no âmbito do direito civil, o Novo Código de Processo Civil tem apenas papel subsidiário no regramento da execução fiscal, pois a mesma possui lei específica, a lei nº 6.830/1980.
Dessa forma, alguns dos benefícios que o Novo CPC apresenta aos devedores não se aplicam em situações de execução fiscal, uma vez que a aplicação se dá primeiramente pela lei específica, e depois pelo Novo CPC, caso necessário.
Portanto, o artigo 914 do Novo CPC, que permite que o executado possa embargar a execução sem garantia do juízo, não é aplicado na execução fiscal, embora seja regra no âmbito do Direito Civil.
“Art. 914. O executado, independentemente de penhora, depósito ou caução, poderá se opor à execução por meio de embargos”.
Isso se dá dessa forma pelo princípio da especificidade, uma vez que há lei específica, a Lei de Execução Fiscal (LEF), que determina a necessidade do depósito prévio para que o executado entre com embargos, conforme aponta o parágrafo 1º do artigo 16:
“Art. 16. § 1º – Não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução”.
A Dívida Ativa
A Lei de Execução Fiscal, conforme apresenta o artigo 1º da lei nº 6.380/80, rege as execuções judiciais para cobrança da Dívida Ativa da União, dos estados, do Distrito Federal os dos municípios.
A Dívida Ativa é definida como todo o crédito que o Estado possui, de origem tributária ou não, a partir de devedores. Conforme o parágrafo 2º do artigo 39 da lei nº 4.320/64, a Dívida Ativa é definida da seguinte forma:
“§ 2º – Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais”.
Todo o valor devido ao Estado se torna parte da Dívida Ativa após apurada a sua liquidez e certeza de existência.
A partir disso, é gerado um título executivo extrajudicial, chamado Certidão de Dívida Ativa (CDA), que comprova que o débito existe e que precisa ser pago.
Certidão de Dívida Ativa (CDA)
Além disso, cumpre destacar que a dívida ativa é definida como todo crédito que o Estado possui, de origem tributária ou não, a partir de devedores. Conforme §2° do art. 39 da Lei 4.320/64:
“§ 2º – Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais.”
Já a CDA é o título executivo extrajudicial que comprova a existência do débito e a obrigação da quitação. Nesse sentido, a CDA deve conter obrigatoriamente os itens do art. 202 do Código Tributário Nacional:
“Art. 202. O termo de inscrição da dívida ativa, autenticado pela autoridade competente, indicará obrigatoriamente:
I – o nome do devedor e, sendo caso, o dos co-responsáveis, bem como, sempre que possível, o domicílio ou a residência de um e de outros;II – a quantia devida e a maneira de calcular os juros de mora acrescidos;III – a origem e natureza do crédito, mencionada especificamente a disposição da lei em que seja fundado;IV – a data em que foi inscrita;V – sendo caso, o número do processo administrativo de que se originar o crédito.”
Além disso, desde que regularmente inscrita, goza da presunção de certeza e liquidez e tem o efeito de prova pré-constituída.
Nulidade da CDA
Conforme visto anteriormente, a Certidão de Dívida Ativa é o título que constitui e fundamenta a Execução Fiscal. Nesse caso, a CDA deve estar instruída de requisitos obrigatórios, conforme art. 202 do Código Tributário Nacional.
Na falta desses requisitos, ou erro a eles relativo, é causa de nulidade da inscrição e do processo de cobrança dela decorrente. Nesse caso, a nulidade poderá ser sanada até a decisão de primeira instância, mediante substituição da CDA nula, devolvida ao sujeito devedor o prazo para defesa, conforme art. 203 do CTN. Assim, o devedor somente poderá versar sobre a parte modificada, em respeito à ampla defesa e o contraditório.
As etapas de uma ação de execução fiscal segundo a Lei 6.830/80
Caso a Fazenda Pública não consiga receber os valores do devedor por vias administrativas, após 60 dias da certidão de dívida ativa ser emitida, a Fazenda entra com uma ação de execução fiscal pelo judiciário.
Após o recebimento da petição inicial, o devedor recebe o prazo de cinco dias para pagar o débito ou para nomear bens a penhorar que tenham valor equivalente ao montante da dívida, que inclui os juros e moras.
Caso o devedor não pague ou não indique bens a penhorar, a Lei de Execução Fiscal (Lei 6.830/80) define que a penhora pode acontecer com qualquer bem do devedor.
Entretanto, há uma ordem:
- dinheiro;
- título de dívida pública ou de crédito, com cotação na bolsa;
- pedras e metais preciosos;
- imóveis;
- navios e aeronaves;
- veículos;
- móveis;
- por último, direitos e ações.
Caso o devedor não concorde com a execução fiscal, pode-se entrar com outra ação, chamada de embargo à execução fiscal.
Essa ação ocorre separadamente da de execução fiscal, pois o dinheiro ou bem que iria pagar o valor precisa ser garantido.
Prescrição da execução fiscal
A prescrição de uma dívida ocorre após cinco anos de sua constituição, conforme aponta o artigo 174 do Código Tributário Nacional (lei nº 5.172/1966).
“Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.
Parágrafo único. A prescrição se interrompe:
I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal;II – pelo protesto judicial;III – por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;IV – por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor”.
Entretanto, a Lei de Execução Fiscal aponta, em seus regramentos, situações onde a execução fiscal pode ser suspensa e até prescrita.
De acordo com o artigo 40 da LEF, o juiz deve suspender a execução fiscal se o devedor não for localizado ou se bens do mesmo não forem encontrados para penhora.
“Art. 40 – O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição”.
Entretanto, uma vez que a ação já foi ajuizada para se tornar uma execução fiscal, o prazo de prescrição no corre durante esse tempo, conforme aponta o artigo 40.
O parágrafo 2º do artigo 40 aponta que o processo deve ser arquivado caso se passe um ano sem que o devedor ou bens para penhora sejam localizados.
“§ 2º – Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos”.
Para que haja efetiva prescrição da própria execução fiscal, deve-se passar cinco anos após o arquivamento dos autos. Assim, aplica-se, de forma conjunta, os itens dispostos no artigo 40 da LEF e no artigo 174 da CTN.
Problemas da execução fiscal
A execução fiscal no Brasil apresenta vários problemas na esfera jurídica. Como foi exposto no início deste artigo, as execuções fiscais representaram 36% do total de casos pendentes em 2020, segundo a pesquisa “Justiça em Números” do CNJ.
Além disso, as execuções fiscais possuem uma das maiores taxas de congestionamento do país: 87% em 2020. Isso quer dizer que, a cada 100 ações de execução fiscal que ocorreram em 2020, apenas 13 foram baixadas.
Esses dados mostram que as execuções fiscais possuem pouca eficiência, pois o custo das ações ao longo do tempo é muito alto e, quanto mais tempo passa entre a constituição de uma dívida e a sua cobrança pela justiça, menores são as chances da Fazenda reaver de fato esses valores.
E esses problemas são reconhecidos pela própria pesquisa do CNJ, na página 175:
“Historicamente as execuções fiscais têm sido apontadas como o principal fator de morosidade do Poder Judiciário. O processo de execução fiscal chega ao Poder Judiciário depois que as tentativas de recuperação do crédito tributário se frustraram na via administrativa, provocando sua inscrição na dívida ativa. Dessa forma, o processo judicial acaba por repetir etapas e providências de localização do devedor ou patrimônio capaz de satisfazer o crédito tributário já adotadas, sem sucesso, pela administração fazendária ou pelo conselho de fiscalização profissional.”.
Isso não quer dizer que a Fazenda Pública deve desistir de cobrar quem está devendo, mas aponta para um problema causado pelo grande volume de execuções fiscais e pelo baixo retorno das mesmas.
Isso significa que alternativas de cobrança desses valores devem ser pensadas pelo Poder Público, com o intuito de desafogar o Poder Jurídico e de facilitar o recebimento dessas dívidas.
Embargos à execução fiscal
Como vimos anteriormente, cabem embargos à execução fiscal, ou, como também é chamado, embargos do executado, contra a ação de execução fiscal.
Os embargos do executado são uma ação autônoma, que tem relação direta com a cobrança feita pela Fazenda Pública. São nos embargos que o executado se defende da dívida apontada pelo Estado.
Além disso, são também nos embargos que o réu irá discutir a natureza da dívida, se ela é legal ou não, se os valores estão corretos e se ele de fato a deve ou não. É o momento de reunir documentos que comprovem a existência ou não da dívida, além de discutir questões de direito.
Vale ressaltar que, nos embargos à execução fiscal, é necessária a garantia do juízo para entrar com a ação, pois a lei específica regula a sua necessidade.
Também é importante mencionar que os embargos à execução fiscal não possuem, em regra, efeito suspensivo. Cabe ao réu apontar que a continuação da marcha processual pode causar dano irreparável ao mesmo. Se provado, o juiz poderá conceder efeito suspensivo ao recurso.
O que é execução fiscal do IPTU
Uma vez que o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) é uma quantia de ordem tributária, cobrada pelo Poder Público, o não pagamento da mesma pode colocar a pessoa na Dívida Ativa do município, tornando a dívida elegível à execução fiscal.
Como qualquer outra dívida cabível em execução fiscal, deixar a mesma passar em branco pode fazer com que a Fazenda Pública entre com uma ação contra o devedor, que pode acarretar na penhora de bens.
Como fazer defesa da execução fiscal do IPTU
Para se defender da execução fiscal do IPTU, o indivíduo tem duas principais opções: defender-se dentro do próprio processo de execução fiscal, a partir da exceção de pré-executividade; ou entrar com embargos do executado.
Na exceção de pré-executividade, o executado poderá alegar apenas erros e vícios de matéria, o que seria possível caso a dívida tenha prescrito, por exemplo.
Nos embargos de execução, como já abordado neste artigo, o réu poderá se defender da dívida de forma mais ampla, discutindo outros pontos. Precisa, entretanto, depositar a garantia do juízo para entrar com a ação.
De qualquer forma, o ideal é que o indivíduo seja assistido e representando por um advogado ao ser intimado em uma ação de execução fiscal, para que o profissional o guie da melhor forma possível.
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